-23.554294 -46.696256, 19 de abril de 2010, por Gabriela Canale.
O fundo é a cidade sombria, iluminada com luzes de mercúrio. Mas há um risco de quente que rompe a monotonia do fundo. Há uma rajada de luz, uma lufada de átomos, como se uma pincelada agressiva houvesse ali rabiscado um traço. É um traço duplo, e dentro dele há uma gradação de tons que vai do amarelo ao vermelho-vivo. Bem observado, é uma traçada aguda, como se uma agulha em brasa, como se o inferno, como se a fornalha da cidade, como se da fantasmagoria do fundo a força perversa da cidade surgisse repentina, como uma flecha que ofusca e confunde o observador. Mas é um traço demasiado preciso. É um dardo venenoso de luz, traçado e retraçado por algum oculto artista. No fundo, a angústia de galhos encardidos ergue-se ao céu, como mãos em súplica se erguem. Mas o traço é a alegria veloz, quase sórdida, orgulhosa de sua potência, indiferente às súplicas. O traço sabe-se senhor de si, sabe de sua força, e por isso atravessa a angústia com tal audácia. E é belo, como um bastão esbraseado é belo, como um pênis, como é belo um músculo em pleno exercício de contração.
Ygor Raduy